CMN aprova mudanças para pressionar queda da Selic

 

O Conselho Monetário Nacional (CMN) decidiu por estabelecer uma meta de inflação de 3% em 2026 e pela mudança no período de cálculo para alcançá-la. O período do sistema de avaliação passa a ser contínuo, permitindo que o BC persiga a meta determinada para a inflação acumulada em 24 meses.

As duas decisões eram esperadas. A segunda, que valerá somente a partir de 2025, foi levada ao conselho pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, um dos três membros do colegiado, ao lado da ministra do Planejamento, Simone Tebet, e do presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto.

“O que se fazia, antes no Brasil, era abrir mão da meta para cumprir o ano-calendário. Agora o que você faz é o contrário”, disse o ministro Haddad ao anunciar as decisões do encontro, na última quinta-feira (29).

Segundo o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Gustavo Cavarzan, o novo sistema permite ao BC um horizonte maior de tempo para atingir a meta de inflação.

 

A presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e vice-presidenta da CUT, Juvandia Moreira, explicou que, com a Selic em 13,75%, descontado o custo da inflação, o Brasil segue com o maior nível de juro real do mundo, em torno de 9,4%, o que afeta negativamente a economia e a geração de emprego.

 

“A Selic num patamar alto aumenta a dívida pública do governo com os juros pagos com os títulos da dívida pública, dinheiro que poderia ser utilizado para expandir infraestrutura e para ser investido em saúde e educação. Os juros altos também prejudicam as famílias, porque o crédito e o financiamento ficam mais caros. Famílias endividadas consomem menos. Pouco consumo reduz a produção, porque as empresas não estão vendendo. Se as empresas não estão vendendo e estão com estoques parados, elas demitem. Consequentemente, a renda circulando cai e a economia não avança”, afirmou Juvandia.

 

Meta inalcançável

 

O próprio argumento do BC de que o Brasil só terá juros menores quando a inflação estiver no centro da meta vem recebendo críticas, por estar deslocado da realidade econômica do país.

As atuais metas de inflação brasileira para 2023, 2024, 2025 e, agora, 2026, são de 3,25% para este ano e 3% para os demais – sempre com margem de tolerância de 1,5 ponto, para mais ou para menos. O índice de referência para definição das metas utilizado oficialmente no país é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE.

O economista do Dieese destaca que o Brasil apresenta há meses condições econômicas que permitem um processo de redução da Selic.

 

“Temos um cenário com mercado de trabalho pouco aquecido, ainda há um grande contingente de desempregados, subutilizados, precarizados, com renda baixa, o que significa que não temos um cenário de excesso de consumo. O cenário na realidade é de uma população muito endividada que, justamente por conta dos juros elevados, gasta uma parcela cada vez maior de sua renda para pagar dívidas não sobrando recursos para consumir”, disse Cavarzan.

Segundo o economista, apesar do desempenho acima do esperado no primeiro trimestre do ano em função do agronegócio, a atividade econômica brasileira segue estagnada.

 

“A inflação em si caminha firmemente para um processo de redução brusca com os principais fatores que levaram a elevação dos preços no ano passado (como choque na taxa de câmbio, guerra da Ucrania, política de preços da Petrobras e safras agrícolas ruins) sob controle. Sendo assim não existe razão econômica que justifique a manutenção dos atuais patamares de juros no país”, concluiu.

 

Entenda

 

  • O Conselho Monetário Nacional (CMN) é órgão superior do Sistema Financeiro Nacional (SFN), responsável pela formulação das políticas monetárias e de crédito.

 

  • O colegiado é composto pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad (presidente), ministra do Planejamento, Simone Tebet, e presidente do BC, Roberto Campos Neto. Cada um com direito a um voto.

 

  • O CMN se reúne uma vez por mês. Tradicionalmente nas reuniões de junho são definidas as metas de inflação.

 

  • No encontro desta quinta-feira (29), o colegiado estabeleceu a meta de inflação de 3% para 2026 e manteve as metas atuais para 2023 (3,25%), 2024 (3%) e 2025 (3%).

 

  • O colegiado aprovou ainda, por unanimidade, um pedido do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que muda o período de cálculo para alcançar as metas de inflação: deixa de ser ano-calendário, ou seja, fixada para o período de janeiro a dezembro de cada ano, e passa a ser contínua, permitindo que o BC persiga a meta determinada para a inflação acumulada em 24 meses.

 

  • O sistema de avaliação contínua é utilizado em quase todo o mundo, incluindo os bancos centrais dos Estados Unidos (FED), dos países da União Europeia e do Reino Unido, e passará a valer no Brasil somente em 2025.

 

  • Com a mudança no sistema de avaliação, o BC ganha mais flexibilidade para perseguir o nível determinado para a inflação, aumentando a pressão sobre a entidade para que comece a reduzir a taxa básica de juros (Selic), hoje em 13,75%, que faz com que o país continue ocupando o primeiro lugar no ranking de países com a maior taxa de juros reais.

 

*Fonte: Contraf-CUT