É perceptível a falta de entusiasmo de amplos setores da população com as eleições de outubro próximo. Particularmente entre os jovens e setores médios, a descrença na representação política e a revolta ante a impunidade tendem a fazer do voto branco e nulo um instrumento de protesto contra as cúpulas partidárias e os candidatos a cargos eletivos. Neste sentido, alguns movimentos sociais e comunidades da Internet já ensaiam iniciativas, tendentes a ganhar adesões.
Para tanto, contribuem as mazelas do nosso sistema político, suas inconsistências programáticas, distanciamento dos interesses populares, demagogia, corrupção e agravamento de seu caráter oligárquico, com os dispositivos da Justiça Eleitoral que dificultam as alianças políticas e ameaçam a existência dos pequenos partidos, através da denominada cláusula de barreira.
É evidente que o voto branco ou nulo não será o remédio mais adequado para a crise de representação política que assola o País, desde meados do ano passado. O boicote eleitoral só é justificável em condições bastante peculiares, de completa ausência de democracia e liberdades públicas fundamentais, de sociedade civil organizada ou possibilidade comprovada de fraude. Nas condições concretas da sociedade brasileira atual, o referido boicote não uniria as forças políticas, não educaria as massas populares, prejudicaria os candidatos identificados com seus interesses, estimularia o apoliticismo atrasado e niilista e deixaria a representação política como monopólio das classes privilegiadas.
Ao contrário de eleições anteriores, em virtude de circunstâncias do processo político e da própria legislação eleitoral, e também de divergências, o bloco de forças democráticas e populares não pôde unir-se em torno de uma única candidatura presidencial nem de uma plataforma comum de governo, como seria desejável.
Não é verdadeira uma suposta similitude entre a duas candidaturas que polarizam o processo da sucessão presidencial em curso. Embora as forças governistas não tenham feito, na prática, uma autocrítica dos erros cometidos e do não cumprimento de algumas promessas da campanha de 2002, o governo do presidente Lula tem muitos aspectos positivos no campo da política externa, da integração econômica da América Latina, do respeito aos movimentos sociais, da melhoria real do salário mínimo e da ampliação das medidas compensatórias do tipo Bolsa Família, que, nas condições do Brasil, evitam que a fome e a subnutrição atinjam uma parcela expressiva da população pobre.
A candidatura da coligação PSDB/PFL, por sua composição social e política, não tem compromissos com os trabalhadores organizados, nem com os pobres e excluídos e, se vitoriosa, por certo seria pressionada a aprofundar o receituário neoliberal vigente nos oito anos do governo anterior, de baixo crescimento, elevado desemprego, concentração de renda e alienação do patrimônio público. Conforme já vem sendo alardeado pela grande mídia e os arautos da ortodoxia monetarista, trata-se do “enxugamento” do Estado e dos investimentos do governo, arrocho no funcionalismo público e nos trabalhadores, com a redução dos direitos trabalhistas e previdenciários. Chega-se a apregoar que a dívida pública interna de mais de um trilhão de reais teria resultado do “déficit” da Previdência, e não do pagamento de juros aos banqueiros e grandes investidores nacionais e estrangeiros. A opção de resistência a este programa desastroso para o povo brasileiro só poderá ser a ampla participação no processo eleitoral, com o voto maciço e alternativo nas três candidaturas do campo democrático e popular, seja no presidente Lula, na senadora Heloisa Helena ou no senador Cristóvão Buarque, e nos melhores candidatos aos demais cargos eletivos em disputa. O voto consciente deve ser usado como afirmação dos direitos da cidadania, fortalecimento da democracia e pela retomada do crescimento econômico, com redução do desemprego e da exclusão social.
(*) Antonio Fausto do Nascimento foi sindicalista e é atual conselheiro da Associação de Antigos Funcionários do Banco do Brasil (AAFBB)