Ação do Sindicato que venceu os interditos proibitórios em São Gonçalo, garantindo o direito de greve previsto na Constituição, é disponibilizado aqui neste site como modelo da ação para outras entidades de trabalhadores.
Exmº Sr. Dr. Juiz da
Vara do Trabalho da Comarca de São Gonçalo.
SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS DE NITERÓI E REGIÕES, entidade sindical de primeiro grau, com CNPJ nº 30.140.654/0001-00, com sede na Rua Maestro Felício Toledo, 495-sobreloja, Niterói, Centro, CEP 24.030-102, neste ato representado por seu Presidente Jorge Antonio Martins de Oliveira, e assistido pelos procuradores in fine, com endereço na Rua México, 21 – grupo 502/A, Centro, CEP 20.031-144, vem, propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de concessão de liminar, em face de
BANCO BRADESCO S/A., com endereço para citação na Rua Dr. Feliciano Sodré, 81/83, São Gonçalo, CEP 24.440-440;
BANCO ITAÚ S/A – com endereço para citação na Rua Dr. Feliciano Sodré, 140, São Gonçalo, CEP 24.440-440;
BANCO SUDAMERIS DO BRASIL S/A ., – com endereço para citação na Rua Dr. Feliciano Sodré, 99 – São Gonçalo, CEP 24.440-440;
BANCO HSBC BANK BRASIL S/A ., – Banco Múltiplo – com endereço para citação Rua Dr. Feliciano Sodré, 218 – São Gonçalo, CEP 24.440-440, pelos fatos e fundamentos jurídicos que a seguir passa a expor:
1 – Da legitimação ativa.
De acordo com Nelson Nery Junior, em seu ‘Código de Processo Civil Comentado’, 5ª Edição revista e ampliada, Editora RT, “Como a CF 5º XXI, 8º III e 114 § 1º legitimou os sindicatos para propositura de ações coletivas na defesa de direitos difusos, coletivos e individuais da categoria, podem eles propor qualquer tipo de ação visando a tutela daqueles direitos.”
Assim, a posição do consagrado jurisprocessualista está inserida na posição doutrinária predominante, no que tange à legitimação extraordinária dos sindicatos para promoverem a Ação Civil Pública, no âmbito dessa Justiça Especializada.
2 – Dos fatos
O sindicato autor deflagrou movimento paredista, a fim de conquistar a estipulação de melhores condições de trabalho,
bem como, reajuste salarial. O movimento iniciou-se nos termos da Lei de Greve, tão logo, em 1º de setembro último, ficou demonstrada a intransigência da categoria econômica, de não admitir negociações tendentes a satisfazer os interesses dos trabalhadores.
O movimento grevista tem-se pautado pelo respeito às disposições da Lei 7.783/89, que disciplina o direito de greve. Assim sendo, esta entidade sindical, por meio de seus dirigentes sindicais, delegados e membros da categoria, têm comparecido às agências bancárias estabelecidas dentro de sua base sindical, com intuito de convencer aos demais membros da categoria, da necessidade e justiça do movimento. E ainda, esclarecer à população os objetivos da greve, e a tomada de iniciativas tendentes a evitar que o movimento grevista cause prejuízos à população em geral, e aos clientes das casas bancárias, em particular.
Por óbvio, tais ações se realizam no passeio público à frente de cada agência bancária, sem que haja qualquer conturbação da ordem pública. Os dirigentes sindicais, delegados e membros da categoria bancária utilizam-se, portanto, dos meios e das circunstâncias que lhe são assegurados pela legislação em vigor:
“Art. 6º – São assegurados aos grevistas, dentre outros direitos:
I – o emprego de meios pacíficos, tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve;
II – a arrecadação de fundos e a livre divulgação do movimento.
§ 1º – Em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.
§ 2º – É vedado às empresas adotar meios de constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento.
§ 3º – As manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.”
Notório que o movimento grevista dos bancários tem se pautado pelo respeito às instituições democráticas e à população, não havendo notícias de distúrbios envolvendo dirigentes sindicais e membros da categoria, revelando o caráter pacífico deste movimento.
A categoria econômica, porém, vem tentando transformar o legítimo exercício do direito de greve, em uma infração possessória, desvirtuando a legislação substantiva pertinente à proteção da propriedade e da posse, para criar incidentes. Assim, os rés vêm ajuizando “Interditos Proibitórios” perante a Justiça Comum, alegando que a presença dos membros da categoria profissional nos passeios públicos à frente das agências bancárias, configura “turbação e esbulho” da posse.
Lamentavelmente, a Justiça Comum tem acolhido a ridícula tese patronal, de que o exercício de direitos previstos na legislação grevista acarreta turbação ou esbulho à posse e propriedade das casas bancárias. Inclusive, estabelecendo multas, cuja execução levaria à extinção até mesmo das próprias rés, cuja saúde financeira também é notória.
3 – Do Direito
Em verdade, o artifício processual empregado pelas rés, objetiva transferir para a esfera judiciária comum, um conflito típico das relações de trabalho. A greve representa, na dicção de Sérgio Pinto Martins, em “Direito do Trabalho” – Editora Atlas, 12ª Edição, “uma liberdade pública, pois o Estado deve garantir seu exercício.” Segundo o referido doutrinador “há entendimentos de que a greve seria um direito potestativo”. Concluindo que a greve “é um direito de coerção visando à solução do conflito coletivo”.
Portanto, é legítima a atuação dos dirigentes sindicais, delegados, representantes sindicais e membros da categoria – funcionários das rés, quando se postam às portas do seu local de trabalho, na tentativa de “persuadir” seus colegas a apoiarem e a participarem do movimento grevista. Pois isto, é o que lhes garante a legislação trabalhista aplicável aos conflitos entre trabalhadores e empregadores.
Às rés, entretanto, interessa excluir da apreciação desta Justiça Especial as controvérsias e incidentes decorrentes da dinâmica de um movimento grevista. Pretendem, assim, refugir à ciência da justiça laboral acerca dos princípios que norteiam o direito do trabalho pátrio, inclusive, o direito de greve.
A Constituição Federal vigente eleva os valores sociais do trabalho à qualidade de Fundamento do Estado Democrático de Direito em que constitui a República do Brasil.
O direito de propriedade também é assegurado na Constituição, entretanto, “deverá atender a sua função social” (CF, 5º, inc. XXII e XXIII). O direito à propriedade, portanto, não é um fundamento da República, mas um direito individual de mesmo nível que o de “reunião” (inc. XVI), de “livre manifestação” (inc. IV E IX). De sorte que, a proteção da propriedade deve se dar em respeito à proteção do livre direito de manifestação, e, por conseguinte, do livre exercício do direito de greve (art. 9º).
Como vemos, a proteção da propriedade, o direito de greve, e o de livre manifestação e reunião, encontram-se no mesmo patamar constitucional, exigindo do poder judiciário que encontre formas de garantir o exercício de todos esses direitos, concomitantemente. Como nenhum direito é absoluto, se impõem restrições tanto do lado do empregador, quanto do lado do trabalhador. Dessa forma, nem o empregado está autorizado a invadir a agência bancária para depreda-la, como não se pode proibi-lo de postar-se no passeio público, a fim de convencer seus colegas de trabalho a aderirem ao movimento paredista. Lembrando, sempre, que a categoria profissional, preocupada com a população, vem, mantendo em pleno funcionamento, as máquinas de auto-atendimento, que permitem o saque de numerário, o depósito de dinheiro e cheques e, ainda, o pagamento de contas.
Destacam-se na ordem constitucional, como já vimos, os valores sociais do trabalho que devem ser analisados à luz do outro fundamento desta República: “a dignidade da pessoa humana” – art. 1º, inc. III e IV. O movimento paredista em tela tem por objeto aprimorar as relações de trabalho, garantindo melhores condições de trabalho e remuneração.
O livre exercício do direito de greve não pode ser restringido, exceto, quando excede aos limites fixados pela Lei 7.783/89.
Assim sendo, é a presente para reclamar desta Justiça Especial, medidas que assegure à categoria profissional, a possibilidade do exercício de seus direitos trabalhistas, em particular, o de autotutela de seus interesses por meio da greve.
4- Da concessão de liminar.
A Lei 7.347/85 prevê em seu art. 3º, dois objetos:
– A condenação em dinheiro e obrigação de fazer e não fazer.
Pela presente, pretende o Sindicato autor que as rés se abstenham de práticas que visem impedir o livre exercício da representação sindical e do direito de greve. Porquanto, vêm as rés, com, fundamento em liminares obtidas em Interditos Proibitórios perante Justiça Comum, cerceado a presença de dirigentes sindicais em seus estabelecimentos, e ainda, constrangido o sindicato autor à pesadas multas em caso de permanência no passeio público às portas das agências, para fins de persuasão dos demais trabalhadores, o que, por sua vez, fere a legislação disciplinadora da greve.
Assim, na forma do que dispõe o art. 11 da Lei da Ação Civil Pública, c/c os arts. 273 e 461 do CPC, requer-se, que SEJA LIMINARMENTE DEFERIDA A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA ESPECÍFICA DA OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER.
Presentes que estão os pressupostos insculpidos na legislação supracitada: a verossimilhança das alegações do sindicato autor e fundado receio de dano irreparável e de difícil reparação, sendo certo, ainda, que as rés ao se valerem da legislação possessória incorre em “Abuso do direito de defesa” .
A alegação é verossimilhante porque a legislação pátria assegura o direito de greve, o direito de reunião pacífica em via pública e de livre manifestação de idéias, enquanto o comportamento das rés, esgrimando uma violação à propriedade, tenta impedir os trabalhadores de exercerem direitos que lhe são assegurados na Constituição e na legislação ordinária. Não pode a propriedade ser usada senão de acordo com a sua função social.
Sem dúvida, há fundado receio de dano e de difícil reparação, não só para o sindicato autor e a categoria que representa, mas às próprias instituições democráticas, porquanto, o direito de greve, o direito de resistência à arbitrariedade dos empregadores, revela-se essencial para a redução das desigualdades sociais e do desenvolvimento nacional, que constituem objetivos fundamentais da República, à luz do art. 3º, da Constituição. A greve, desde que exercida nos ditames da legislação disciplinadora, constitui a forma mais contundente de manifestação de vontade dos trabalhadores.
Permitir que as empresas, entre elas as rés, cerceiem o direito de greve e impeçam o pleno exercício do mandato sindical, causa à sociedade um temor. O judiciário tem o dever de sinalizar a esta sociedade, que não permitirá o abuso de direito, nem a ofensa à ordem constitucional, inclusive pelos banqueiros. Até estes têm que se submeter à lei.
5 – Do pedido
Requer-se que seja deferida liminarmente a antecipação da tutela específica da obrigação de fazer e não fazer, para determinar-se às rés que:
a- Abstenham-se de adotar procedimentos que impeçam o livre exercício do direito de greve, permitindo aos dirigentes sindicais, representantes e delegados sindicais e membros da categoria bancária, atuem no sentido de obterem adesão dos trabalhadores, nos estritos termos da legislação de greve;
b- Abstenham-se de adotar procedimentos que impeçam a realização de manifestações pacíficas à frente dos estabelecimentos bancários deste Município;
c- Abstenham-se de adotar procedimentos que impeçam o pleno exercício da representação sindical, assegurando aos dirigentes da entidade, delegados e representantes sindicais e credenciados (membros da categoria), acesso às instalações das rés, para distribuição de material informativo das atividades sindicais, tais como, jornais e panfletos;
d- Requer-se a confirmação dos pedidos das alíneas A, B e C, em sentença definitiva;
e- Requer-se a fixação de multa diária em caso de descumprimento da ordem judicial.
Face ao exposto, requer a citação das rés para responder à presente, sob os efeitos da revelia, protestando por todas as provas admitidas em direito, documental, testemunhal e depoimentos pessoais .
Dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00.
Mário Roberto Sant’Anna da Cunha
OAB/RJ – 82.250
Myriam Denise da Silveira de Lima
OAB/RJ – 39.064