O governo conseguiu que a Câmara dos Deputados aprovasse, na noite dessa terça-feira (2), e o Senado Federal na quarta-feira (3), a Medida Provisória (MP) nº 1109/22, que institui relações trabalhistas alternativas durante estados de calamidade pública em âmbito nacional, estadual ou municipal, reconhecidos pelo governo central.
Com isso, mesmo em casos de catástrofes ambientais, como chuvas, as regras trabalhistas podem mudar e o trabalhador ser penalizado. Entre as medidas previstas estão teletrabalho; antecipação de férias; férias coletivas; aproveitamento e antecipação de feriados; banco de horas; e suspensão do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que será retomado após o fim da medida alternativa, em seis parcelas, sem juros e multas.
A medida também permite a suspensão temporária de contratos de trabalho, com compensação do pagamento do Benefício Emergencial (BEm) mensalmente aos atingidos. O valor do BEm é calculado pelo valor dos últimos três salários, correspondendo ao seguro-desemprego em caso de demissão.
Em caso da redução de 25% de jornada e salários, o trabalhador recebe 75% do salário e 25% da parcela do BEm; na redução de 50% da jornada, recebe 50% do salário e 50% da parcela do BEm; e na redução de 70%, recebe 30% do salário e 70% do benefício. O período máximo previsto para a redução da jornada e a suspensão dos contratos de trabalho é de 90 dias, mas pode ser prorrogado enquanto durar a calamidade.
Para o secretário de Relações do Trabalho da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Jeferson Meira, o Jefão, “o executivo mais uma vez interfere de forma negativa e prejudicial nos direitos da classe trabalhadora, com medidas provisórias. E é vergonhoso que parlamentares, que deveriam legislar em benefício do povo, chancelem e ainda piorem os arroubos desse desgoverno, sem nenhum compromisso com o país”.
Oposição critica conteúdo e tramitação
No Senado, a oposição reagiu contra o ritmo acelerado com que a PLV foi aprovada e classificou suas mudanças como “reforma trabalhista” e “cheque em branco” em prejuízo do trabalhador. Esses senadores entendem que o tema deveria ter uma discussão maior no parlamento e na sociedade.
“Já vou para 40 anos de mandato e nunca vi algo semelhante. Essa medida provisória não passou nem em debate na comissão mista, não teve uma audiência pública, não se ouviu a sociedade, não se ouviu o empresário, não se ouviu o trabalhador, não se ouviu o movimento sindical”, disse o senador Paulo Paim (PT-RS).
O líder da minoria, senador Jean Paul Prates (PT-RN), defendeu a rejeição do projeto, “por não haver absolutamente nenhuma emergência neste momento para se discutir isso, pela falta de condições de debates adequados, participativos, representativos de todos os envolvidos, pelo fato de terem sido rejeitadas todas as emendas, mostrando que não houve debate, ou abertura para aprimoramentos e por representar uma precarização unilateral das relações de trabalho”.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN), denunciou que a medida vai atingir os trabalhadores quando eles estiverem mais fragilizados. “São eles que perdem as suas casas e os seus familiares soterrados, no caso de enchentes. Quer dizer que, além de estar no meio de uma calamidade, eles ainda vão ter que abrir mão do seu trabalho? Por favor, gente! Isso é muito cruel”, disse.
Teletrabalho e auxílio alimentação
No mesmo dia, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei de Conversão (PLV) 21/22, resultante da MP 1108/22, que regulamenta o teletrabalho e altera regras do auxílio alimentação, que inclui os vales refeição e alimentação.
A medida determina que o auxílio alimentação seja destinado somente a refeições em restaurantes ou na compra de gêneros alimentícios. As empresas também ficam proibidas de obter descontos no fornecimento dos tíquetes de alimentação, pois esse abatimento acaba por ser repassado ao trabalhador.
O teletrabalho – ou trabalho remoto – foi definido como prestação do serviço fora das dependências da empresa, que não pode ser caracterizado como atividades externa, pela sua natureza. Essa modalidade deverá ser expressa no contrato individual de trabalho.
Confira as novas regras da medida incluídas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):
- Empregadores são dispensados de controlar as horas trabalhadas em contratação por produção ou tarefa;
- A presença do trabalhador no trabalho para tarefas específicas, mesmo que habitual, não descaracteriza o trabalho remoto;
- O contrato poderá dispor sobre os horários e meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que assegurados os repousos legais;
- O uso de infraestrutura e ferramentas digitais fora da jornada não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver acordo;
- O teletrabalho também poderá ser aplicado a aprendizes e estagiários;
- O trabalho remoto não se confunde e nem se equipara à ocupação de operador de telemarketing ou de teleatendimento;
- O empregador não será responsável pelas despesas ao retorno presencial do empregado que mora fora da sede, salvo acordo;
- Terão prioridade no teletrabalho os empregados com deficiência e com filho ou criança de até quatro anos de idade sob guarda judicial.
Jefão, que é o responsável na Contraf-CUT pelo acompanhamento dos temas de interesse dos trabalhadores em tramitação no Congresso Nacional, denuncia que “na verdade o governo aproveita o cenário legislativo favorável aos interesses apenas do mercado e seus aliados empresários e continua produzindo minirreformas trabalhistas, retirando o que restou dos direitos e promovendo mais miséria e desalento à população. Por isso, é importante que os trabalhadores e trabalhadoras se atentem e votem em quem realmente os representarão no parlamento brasileiro.”
As duas matérias, originadas pelas MPs 1108 e 1109, seguem agora à sanção presidencial, último passo para que sejam publicadas e se tornem lei.